março 05, 2013

"O Português na Encruzilha"

Extratos de artigo publicado no Expresso a 2013mar02, da autoria de Margarita Correia (*), citado a partir do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa (link para o texto integral de artigo) .


[...]
O português encontra-se agora numa encruzilhada. À sua frente estão grosso modo dois caminhos: a via A, que poderá conduzi-lo a tornar-se, a longo prazo, em uma ou mais línguas centrais; a via B, que poderá conduzir a manter o seu estatuto de língua supercentral.

[...]
O  Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (AO) constitui um instrumento de política linguística que visa a prossecução da via B.

A ortografia não é assunto pacífico: mera norma que convenciona as regras de escrita, a ela são associados aspetos culturais, históricos, ideológicos, económicos, estéticos, etc. Outras línguas europeias passaram ou estão a passar por reformas ortográficas: o espanhol em 2010; o neerlandês em 1996 e 2006; o alemão em 1996; o francês, como nós, em 1990, aplicando-a, também como nós, só agora.

Mais que unificar a língua portuguesa, o AO visa unificar as regras de escrita, conferindo a essas regras flexibilidade suficiente para que as formas resultantes da sua aplicação respeitem a variedade falada em cada país.


O AO é aplicável e está efetivamente em uso, de forma generalizada, no Brasil e em Portugal, que criaram instrumentos reguladores com apenas ligeiras divergências entre si.




[...]
A discussão sobre o AO tem uma matriz política e ideológica e nela se confrontam as vias A e B, que constituem rostos de duas visões diametralmente opostas sobre a posição de Portugal no Mundo. Os entraves, supostamente linguísticos e técnicos, tantas vezes invocados para contrariar a aplicação do AO são sobretudo subterfúgios que visam opacificar uma discussão que se desejaria transparente.

A aplicação do AO é uma medida de política linguística e é pelos políticos que deve ser tomada, como qualquer outra reforma com efeitos sobre o Estado e as suas instituições. Desde a sua assinatura em 1990, todos os responsáveis políticos eleitos em Portugal o apoiaram explicitamente, incluindo-o várias vezes nos programas eleitorais que levaram a sufrágio.


Aos cidadãos cabe o direito a ter opiniões divergentes e a manifestá-las publicamente. Que o façam é não só possível como salutar, num estado democrático. Espera-se, no entanto, que o façam com verdade, transparência, espírito construtivo e civilidade.



(*) Sobre Margarita Correia (fonte, Ciberdúvidas da Língua Portuguesa), 
Vice-presidente do Instituto de Linguística Teórica e Computacional (ILTEC);
- Professora na  Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Especializada na área dos estudos do léxico,
- Coordenadora do Portal da Língua Portuguesa (ILTEC), que integra desde 2010 o Vocabulário Ortográfico do Português
Autora de:
-Denominação e Construção de Palavras (Lisboa, Colibri, 2004);
-Os Dicionários Portugueses (Lisboa, Caminho, 2009).
Coautora de:
- Inovação Lexical em Português (Lisboa, Colibri, 2005); 
- Neologia do Português (São Paulo, 2010); e,
- Um Olhar sobre a Morfologia dos Gestos (Lisboa, Universidade Católica Editora, 2011).

3 comentários:

  1. Olá! Não sei se o erro é vosso ou do original, mas a autora é Margarita e não Margarida ;)Aproveito para vos dar os meus parabéns pelo bom trabalho em prol do esclarecimento e da verdade em relação ao AO.

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    1. Olá, Eunice.
      Uma vez mais, obrigado pela sua ajuda. Está feita a correção.

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  2. O neerlandês... Ah, então foi para competir com os 28 milhões de falantes de neerlandês que alterámos o português... e os apenas 120 milhões de falantes de alemão...

    Fala-se muito das reformas dos outros países, mas toda a gente convenientemente ignora aquela língua que nunca teve reformas oficiais/estatais: a língua inglesa, a língua franca do mundo, a língua com duas ortografias oficiais (defense/defence, program/programme, catalog/catalogue, theatre/theater). Afinal, é disto que estamos a falar. O português não está a competir com o espanhol ou francês ou neerlandês. Está a competir com o inglês, exemplo glorioso de deixar uma língua em paz para que se desenvolva livremente. Os outros preocupam-se com reformas e as suas línguas vão tornando insignificantes ainda assim, ao passo que todos falam inglês apenas porque é uma língua que todos querem falar, porque é uma língua associada com coisas fixes - TV, cinema, música, ciência, informática. Nenhuma reforma obrigará estrangeiros a interessar-se mais pela nossa língua, porque pouco temos para dar que possa competir com a cultura anglo-americana.

    Diz-me, que benesses trouxa a reforma ao neerlandês? E ao alemão? Mais alunos estrangeiros interessados nela? Mais traduções dos seus autores? Mais exposição mundial? Pois, a resposta é não para todas estas questões.

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