junho 15, 2012

Atraso e Isolamento Culturais por Despacho


O presidente da Câmara Municipal da Covilhã emitiu um despacho que suspende a aplicação do AO nos organismos municipais e estipula que a ortografia atualizada só será aplicada em 2015 quando terminar o período transitório. Até lá, os documentos do município e entidades agregadas serão redigidos na ortografia antiga. O texto do despacho está disponível neste momento no sítio eletrónico da CMCovilhã.

Existem dois pontos relevantes no despacho do presidente da CMCovilhã:
“[L]argos sectores da sociedade portuguesa têm vindo a questionar o método e a substância deste Acordo, na vertente da sua relação com a realidade ortográfica presente e com a falta de consenso nacional sobre esta matéria”.
O comunicado não concretiza que setores nacionais são esses, mas poderia porque eles são conhecidos. Por um lado, são os setores mais xenófobos da sociedade portuguesa; por outro, são os setores mais antilusófonos; e por último, o lobby antibrasileiro dos maus tradutores portugueses. Quanto à classificação “largos”, no sentido de numerosos, essa é impossível demonstrar.
“[Constata-se] uma falta de unidade na expressão estética em língua portuguesa que, no caso em apreço, é portador de um correlativo desprestígio institucional.”
O que significa “falta de unidade na expressão estética”? Insubstatividade frásica à parte, a que “estética” se refere o despacho do presidente da Câmara e quem são os estetas? Será que o presidente da CMCovilhã impede o uso da ortografia atualizada da Língua Portuguesa porque prefere uma ortografia com uma estética mais arcaica ou, quem sabe, mais lyoncificada?

E onde está o referido “desprestígio institucional” que não seja precisamente aquele que resulta da decisão do presidente da Câmara da Covilhã de proibir a aplicação da ortografia da Língua Portuguesa em pleno uso no Estado, na generalidade dos órgãos de comunicação social, em todos os graus e estabelecimentos de ensino público e privado, nos jornais oficiais de Portugal e da União Europeia, em partidos políticos como o PSD, PS e BE, na Igreja Católica, em todos os municípios portugueses, na Associação Nacional dos Municípios Portugueses, na Associação Nacional de Freguesias, no Fórum das Autoridades Locais da CPLP e que foi ratificada por todos os países lusófonos, com a exceção (por agora) de Angola

Como se constata, nem sempre o atraso e o isolamento do interior são estruturais; também podem ser decretados por despacho municipal.

Noticias relacionadas:
Diário As Beiras: Município da Covilhã e entidades agregadas não vão usar o novo acordo ortográfico;
CNotícas.net: Camara não adota acordo ortográfico;


Texto do despacho, conforme captura às 18:40 de hoje.
"Nos termos do Aviso n.º 255/2010, de 13 de Setembro, publicado no Diário da República, 1ª série, de 17 de Setembro de 2010, o novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa já se encontra em vigor na ordem jurídica desde 13 de Maio de 2009.
Contudo, a Resolução da Assembleia da República n.º 35/2008, de 29 de Julho, que aprovou o Acordo Ortográfico, prevê um prazo transitório de seis anos para a implementação da nova grafia, ou seja, decorre até 2015 um período de transição durante o qual ainda se pode utilizar a grafia actual.
Entretanto, largos sectores da sociedade portuguesa têm vindo a questionar o método e a substância deste Acordo, na vertente da sua relação com a realidade ortográfica presente e com a falta de consenso nacional sobre esta matéria, constatando-se deste modo, uma falta de unidade na expressão estética em língua portuguesa que, no caso em apreço, é portador de um correlativo desprestígio institucional.
Nestes termos, por despacho de hoje, 15 de Junho, o Presidente da Câmara da Covilhã determinou que em toda a correspondência oficial da Autarquia e das entidades agregadas, não seja adoptado o novo Acordo Ortográfico, nos termos do período transitório estabelecido, reponderando-se esta determinação no final daquele período, isto é, em 2015."

Seixas da Costa sobre a Lusofonia

O embaixador Francisco Seixas da Costa referiu-se no seu blog ao festival Rio Loco, promovido anualmente pela Mairie de Toulouse, e que este ano é dedicado à Lusofonia


O post não deve apenas ser lido, deve também ser visto, atendendo à beleza da imagem publicada.

Destacamos o trecho final:
"Se os outros, os estrangeiros, nos qualificam como lusófonos, quem somos nós para recusar esse epíteto? Viva a lusofonia, esse fundo de riqueza de países de onde sempre se vê o mar, com culturas saudavelmente diferentes e muitas vezes distantes mas que, no essencial, se reúnem, com uma cada vez maior naturalidade, à volta de uma língua - mas também de uma bacalhauzada bem regada ou de um pastel-de-nata."

junho 09, 2012

Os Escritores Moçambicanos e o AO

A Associação dos Escritores Moçambicanos (AEMO) tomou posição sobre a notícia da ratificação do Acordo Ortográfico pelo governo de Moçambique:
A Associação dos Escritores Moçambicanos (AEMO) congratulou-se hoje com a ratificação pelo Governo moçambicano do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, considerando que a decisão coloca o país ao corrente da evolução que a língua registou nos últimos tempos.
[...]
"É bem-vindo o Acordo Ortográfico porque estávamos ansiosamente à espera que vigorasse em Moçambique. A língua não é estática, evolui e temos que estar a par dessa transformação" disse à Lusa Jorge Oliveira, secretário-geral da AEMO.
Jorge Oliveira entende que com a ratificação do acordo pelo Conselho de Ministros, Moçambique deu um passo importante no esforço de harmonização das várias ortografias usadas na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa.
"Penso que estão refletidas no acordo as várias tendências ortográficas em uso na CPLP. Essa preocupação ficou patente desde os trabalhos preparatórios do acordo. Moçambique está lá representado", assinalou Jorge Oliveira, rejeitando a ideia de que o tratado foi imposto pelo Brasil e Portugal. [Fonte: Notícias Sapo Angola]
O mais destacado escritor moçambicano,  Mia Couto, já tinha declarado a sua satisfação pela ratificação do AO pelo seu país.


Como é habitual nestas questões, os melhores exemplos de cultivo, valorização e reconhecimento da importância da internacionalidade da Língua Portuguesa vêm de fora. Em contrapartida, os maiores obstáculos à projeção internacional e à unidade da Língua Portuguesa são protagonizados por portugueses. A este respeito, é bastante esclarecedor confrontar a posição do secretário-geral da AEMO com a posição dos presidentes da Associação Portuguesa de Escritores e da Sociedade Portuguesa de Autores.

junho 08, 2012

Governo Moçambicano Aprovou a Proposta de Ratificação do AO90

Pós-post a 2012, jun, 11; a informação original aqui postada cita notícias que referem a ratificação ao AO pelo governo moçambicano. Estas notícias são agora corrigidas pelo Ministério dos Estrangeiros e Cooperação de Moçambique, como se pode constatar pela citação seguinte:
O Ministério dos Negócios Estrangeiros e Cooperação emitiu um comunicado para clarificar as imprecisões linguísticas havidas na conferência de imprensa da última sexta-feira, na qual o ministro da tutela deu como ratificado o acordo ortográfico. No comunicado, o Ministério dos Negócios Estrangeiros e Cooperação refere que o que o governo moçambicano aprovou, na última quarta-feira, foi a proposta de resolução que ratifica o Acordo Ortográfico de Língua Portuguesa, a ser submetido à Assembleia da República (AR), o parlamento moçambicano, para efeitos de aprovação, não propriamente o acordo ortográfico, porque este só depois de submetido ao mais alto órgão legislativo para efeitos de discussão e análise é que poderá ser aprovado e, subsequentemente, entrar em vigor. [Fonte: O País]
É presumível que o parlamento moçambicano apoie a proposta governamental de adesão do país à ortografia unificada da Língua Portuguesa.

Notícia relacionada: "Aprovada proposta de ratificação do Acordo Ortográfico; Portal do Governo de Moçambique"

O título do post foi corrigido; em seguida apresenta-se o conteúdo original do post.



O Governo Moçambicano ratificou o AO90:
O Conselho de Ministros de Moçambique ratificou na quinta-feira [07 junho] o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, declarou hoje o ministro moçambicano dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, Oldemiro Baloi, seguindo o exemplo dos governos de Brasil, Cabo Verde, Portugal, São Tomé e Príncipe, Guiné-Bissau e Timor-Leste.

A posição do governo de Moçambique relativa à adopção do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa tem em conta a presidência da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), que assumirá a partir de Julho, durante a cimeira de chefes de estado e de governo da comunidade lusófona, que se realizará em Maputo. [Fonte: Público]

Sobre a ratificação por Moçambique do Acordo Ortográfico o escritor moçambicano Mia Couto declarou:
"Fez bem o Conselho de Ministros ao ratificar o acordo, porque o país não podia ficar uma ilha e à margem da nova situação provocada pela vigência da ortografia aprovada pela maior parte dos países da CPLP [Comunidade dos Países de Língua Portuguesa)", afirmou Mia Couto.
Lembrando que nunca foi "muito adepto" das alterações introduzidas pela nova ortografia, o escritor considerou que o acordo não traz mudanças substantivas, mas cosméticas e formais. [fonte: RTP].

O AO90 entrou em vigor em Portugal no dia 13 maio 2009, data do depósito do instrumento de ratificação, conforme aviso 255/2010 publicado no Diário da República de 17 setembro 2010.

Com a ratificação moçambicana, Angola passou a ser o único membro da CPLP que ainda não ratificou o AO90.

Moçambique assume a presidência da CPLP a partir de julho próximo.



Notícias relacionadas
- Angola Press: Moçambique: Governo ratifica Acordo Ortográfico.
- ionline: Acordo Ortográfico. Governo angolano é o único que ainda não aprovou documento (inclui o historial das ratificações AO pelos países membros da CPLP.

junho 05, 2012

O “Egito”, o “egípcio” e o AO90

É habitual ler algumas avaliações negativas sobre o valor técnico do AO atendendo à eliminação do ‘p’ mudo em Egipto uma vez que o respetivo gentílico continua a ser egípcio.

No caso importa saber se a aparente discrepância Egito/egípcio é uma novidade na ortografia portuguesa trazida pelo AO ou se, pelo contrário, as irregularidades entre a designação de lugares (cidades, regiões, países) e os respetivos gentílicos são, afinal, normais e aceitáveis na língua portuguesa.

Procuremos, então, nomes de locais/países, em que os gentílicos estão mais próximos do étimo original (latino ou outro) do que a palavra usada para o lugar a que se referem:
      Chipre – cipriota
      Mónaco – monegasco
      Beja – pacense
      Braga – bracarense
      Bragança – brigantino
      Chaves – flaviense
      Coimbra – conimbricense
      Évora – eborense
      Guimarães – vimaranense
      Guarda – egitaniense
      Lagos – lacobrigense
      Santarém – escalabitano
      e agora também, Egito – egípcio.

Em conclusão, a existência de gentílicos sem correspondência estrita com a designação atual dos lugares respetivos não é uma novidade na Língua Portuguesa; trata-se antes de uma situação normal, ainda que rara, própria de uma língua que, na sua génese, é uma corrupção sistematizada da língua de origem, o latim.

Acresce que o 'p' de 'Egito' foi mantido na reforma ortográfica portuguesa de 1911 por um simples motivo: ao tempo, aquele 'p' era pronunciado; de outro modo teria sido eliminado como aconteceu por exemplo, com o 'c' de 'dicionário', apesar de ter mantido sido mantido em 'dicção'. Recorde-se que todas as consoantes etimológicas não pronunciadas foram eliminadas na reforma ortográfica portuguesa de 1911, restando apenas aquelas que, supostamente, influenciavam a pronúncia de uma vogal átona anterior.

Portanto, a questão que se coloca àqueles que imaginam que encontram um “erro técnico” em Egito/egípcio é a seguinte: o que é que o par Egito/egípcio (pós AO) tem de tão errado que o par Chipre-cipriota (antes e pós AO) e muitos outros têm de tão certo?

junho 01, 2012

AO: da inutilidade à utilidade


Extratos de duas entrevistas a Inês Pedrosa separadas por pouco mais de oito meses:
“O novo acordo é, no fundo, completamente inútil.”
2011 set 02, Correio da Manhã
[H]á um ano ligaram-me do Brasil a querer comprar o meu livro “Nas Tuas Mãos”. O governo anda a comprar livros para as escolas e quando o faz são encomendas de milhares de exemplares para os liceus. Mas só o compravam se fosse com o acordo. Eram 7 mil ou 10 mil a mais, e eu disse “com certeza”;
2012 mai 12, ionline