agosto 26, 2012

Não Tenhas Medo, Pedro


O Pedro Afonso, membro da Associação de Estudantes do IST, também teve um lugar na campanha de difamação antiAO90 que o Publico tem vindo a promover. Vai daí, o Publico publicou na 6af passada um artigo assinado pelo Pedro Afonso. Nele, o Pedro Afonso enuncia os muitos medos tem sobre o AO90.


O Pedro é um jovem, e estou certo que aceitará bem o tom pessoal e o tratamento  por “tu” que uso neste post que lhe dirijo.


Pedro, tu começas por ter medo do Acordo Ortográfico porque ele é uma medida "prepotente e antidemocrática" (sic) fixada por via legal. No entanto, não tens preocupações dessa natureza quando à ortografia que usas e que queres continuar a usar e que foi fixada por via legal em 1911 e atualizada também por via legal em 1945 e 1973, em todos os casos em momentos históricos em que as eleições eram uma farsa. Então, se não tens problema em usar e manter uma norma ortográfica fixada em ambientes políticos pouco ou nada democráticos, porque hás de ter medo de uma atualização fixada e implementada em legislaturas democráticas? Não tenhas medo, Pedro.


Pedro, tu achas que o AO90 vai fracassar porque falha o propósito de unificar o “vocabulário” (sic) e a sintaxe. Mas tens de ir ler melhor o AO90, Pedro, porque o propósito do AO90 é a uniformização da ortografia, e não do léxico nem da sintaxe. E também não deves ter dúvidas sobre a exequibilidade do propósito, basta lembrares-te que, por exemplo, o Espanhol e o Árabe têm sintaxes e léxicos mais diversificados que o Português e, no entanto, todos os países que os usam oficialmente se empenham em manter uma norma ortográfica única. Em que é que nós, portugueses e brasileiros, somos inferiores a marroquinos ou iemenitas, a espanhóis ou argentinos? Não tenhas medo, Pedro.


Pedro, tu tens medo de que portugueses deixem de perceber que os egípcios são naturais do Egito uma vez que Egito já não se escrever com ‘p’ mudo. Mas lembra-te que os portugueses já hoje percebem de onde são os vimaranenses e os cipriotas, e que estas discrepâncias dos gentílicos são raras mas aceitáveis em Português. Não tenhas medo, Pedro.


Pedro, tu AINDA (!!!) acreditas que dizíamos “recepção” com a pré tónica aberta porque estava lá um ‘p’ mudo para indicar a pronúncia correta. Mas tu não podes escrever coisas destas, Pedro, porque nos deixas com dúvidas sobre os teus hábitos de leitura, ou pelo menos sobre a atenção com que o fazes. Repara que, em Português, existem muitas palavras que têm pré tónica aberta sem o “auxílio” de uma muda, e muitas outras que têm pré tónica fechada apesar do “auxílio” de uma muda.  

E para te ajudar a ultrapassar a "Falácia das Mudas Diacríticas", aqui fica um exercício para resolveres: “Nas palavras seguintes, assinala as que têm pré tónica fechada, as que têm pré tónica aberta, e diz a importância que tem uma consoante muda para indicar a pronúncia correta em todas elas: bebé, actuar, caveira, vexame, especado, exactidão, tactear, pateta, dilação”.

Como vês, consoantes mudas não abrem (nem nunca abriram) vogais pré tónicas. Não tenhas medo, Pedro.


Pedro, tu tens medo das novas facultatividades consagradas no Português pelo AO90. Mas as facultatividades existiam, existem e existirão enquanto o Português for uma Língua viva, ficando ao critério dos falantes determinar, com o tempo, as formas que se mantêm e as que passam a obsoletas. O Latim não tem recebido facultatividades, porque está morto, mas o Português recebe, porque está vivo. Não tenhas medo, Pedro.


Pedro, tu tens medo das potenciais perdas económicas com a mudança de ortografia. Mas não tens razões para ter medo de tais coisas. Em primeiro lugar, o AO90 não constituiu uma rotura com a norma ortográfica anterior, pelo que não foi, como não é, ao contrário do que escreveste, necessário substituir livros nem reverter documentos para a ortografia atual. No que respeita a manuais escolares, eles têm vindo a ser substituídos ao ritmo normal, e foi até para atender à sua validade se estipulou um prazo de seis anos para o período de transição.

O teu medo das perdas económicas levou-te até a pensar que o AO90 pode prejudicar as exportações de edições portuguesas para o Brasil. Mas há boas notícias que te vão deixar feliz, porque está a acontecer precisamente o contrário daquilo que temias, como podes ver aqui: o AO90: da inutilidade à utilidade. Não tenhas medo, Pedro.


Pedro, tu tens medo que o AO90 tenha efeitos perniciosos sobre a pronúncia das gerações futuras. Oh Pedro, mais isso não pode ser, um homem novo com preconceitos de gente velha! A respeito dos vindouros, não te metas no que não te diz respeito. Nenhum de nós tem o direito de querer determinar as escolhas das gerações futuras, muito menos como irão pronunciar o que quer que seja. O futuro pertence a quem nele viver. A única obrigação que temos para com os mais novos é educá-los no sentido da responsabilidade e do desenvolvimento das suas capacidades intelectuais e outras. E, já agora, não lhes deixar dívidas, ao contrário do que fizeram as duas ou três gerações anteriores à tua.


E concluo com um apelo: Pedro, tu desfaz-te de preconceitos xenófobos antibrasileiros e da influência nefasta do lobby dos maus tradutores. Pensa pela tua própria cabeça, não enfies o barrete dos malsãos. Empenha-te em viver no teu tempo, não vivas agarrado ao passado, nem sequer o ortográfico. Faz justiça à tua idade, não queiras ser um homem novo com cabeça de velho. Alarga a tua visão do mundo, recusa os ghettos, linguísticos ou outros. 

E estuda, rapaz, porque se tivesses estudado, não te tinham enganado.

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