maio 28, 2013

Frango

O juiz Rui Teixeira é um homem prestigiado e prestigiante, basta lembrar a forma como conduziu o famoso “processo Casa Pia”.

Mas, como diz o povo, não há bela sem senão.

Recorremos a esta notícia no DN online citando esta outra notícia publicada na edição em papel do Correia da Manhã de domingo.


Primeira questão:
"O magistrado enviou uma nota à Direção Geral de Reinserção Social (DGRS) em abril onde se podia ler, que esta "'fica advertida que deverá apresentar as peças em Língua Portuguesa e sem erros ortográficos decorrentes da aplicação da Resolução do Conselho de Ministros 8/2011 (...) a qual apenas vincula o Governo e não os tribunais'".
Ora, a DGRS está vinculada ao poder executivo e não ao poder judicial, portanto tem por obrigação cumprir as determinações legais em vigor emanadas pela Tutela, naquilo que ao poder executivo respeita, como é o caso dos usos ortográficos. De resto, nenhum juiz deve, muito menos pode, pretender obrigar as entidades públicas, privadas ou os cidadãos a dirigirem-se aos seus juízos segundo a norma ortográfica da preferência do juiz, quer o juiz prefira a norma ortográfica atual ou a anterior. O sistema judicial e os juízes servem para outros fins.


Segunda questão; voltamos a transcrever o DN:
“nos tribunais, pelo menos neste, os factos não são fatos, as actas não são uma forma do verbo atar, os cágados continuam a ser animais e não algo malcheiroso”
Pois há boas notícias para Rui Teixeira: nos termos do AO90, os factos também não são fatos (embora, segundo as caraterísticas evolutivas do Português, esse seja o seu destino), e os cágados também continuam a ser animais e não algo mal cheiroso.

Quanto à ata/ata; Rui Teixeira é um homem inteligente e vai ser capaz de resolver esta questão tão bem como resolveu sempre estas outras (todas elas existentes tanto na ortografia atual como na ortografia anterior): colher/colher, cor/cor, pena/pena, pregar/pregar, rota/rota, seca/seca, seco/seco, sede/sede, sumo/sumo, acordo/acordo, almoço/almoço, anular/anular, chama/chama, consolo/consolo, dita/dita, erro/erro, fora/fora, força/força, gelo/gelo, gema/gema, golo/golo, jogo/jogo, molho/molho, pela/pela, pelo/pelo, serão/serão, torre/torre, vale/vale, vela/vela/vela.

Se para os defensores da cristalização ortográfica de 1945/73 os casos acima são imutáveis e perfeitos, então o par ata/ata tem tudo para ser integrado e bem aceite na tal imutável perfeição.


Terceira questão; voltamos a citar a carta do juiz Rui Teixeira dirigida à DGRS, segundo o DN:
“[A] Língua Portuguesa permanece inalterada até ordem em contrário'”
Pois aqui temos más notícias para Rui Teixeira mas boas notícias para a nossa Língua: a Língua Portuguesa está viva, portanto ela altera-se e evolui diariamente sem obedecer a nada nem atender a ordens de ninguém. De quando em quando a ortografia deve ser atualizada para que possa acompanhar a evolução da Língua. Foi também isso o que o AO90 veio fazer.


Este caso lembra este outro: todos os melhores guarda-redes - sem exceção - deram em algum momento das suas carreiras grandes "frangos", e nem por isso nunca nenhum deles viu o seu prestígio diminuído na história do futebol.
Independentemente de Rui Teixeira insistir nesta caturrice ou se esquecer dela depressa, este juiz vai continuar a ser uma referência maior para os portugueses e para a Justiça em Portugal.

maio 27, 2013

Mexia Caturra

Pedro Mexia deixou no Expresso de sábado passado mais uma dose de caturrice anti-AO.

Como sem mentiras não há desacordismo, analisemos as mentiras do mais recente acesso de caturrice do Pedro Mexia.


Primeiro, o que PM disse e o que não disse:

- disse que o Brasil suspendeu o AO; falso, o Brasil não suspendeu o AO, o Brasil prolongou o prazo de implementação do AO de 2012 para 2015, e já declarou o seu alinhamento com Portugal nesta matéria;

- disse que a Faculdade de Letras não aplica o AO; mas não disse que as outras duas Faculdades de Letras o aplicam, como não disse que TODAS as instituições  universitárias, públicas e privadas, aplicam o AO;

- disse que a Ass.Portuguesa de Linguística criticou o AO; mas não disse como nem quando o fez, nem disse que a referida Associação aplica o AO;

- disse que o PEN recusou o AO; mas não disse que muitos escritores membros do PEN que votaram contra essa decisão;

- disse que a AP de Editores e Livreiros se distanciou do acordo; mas não disse como nem quando, não disse que a distância da APEL sobre o AO é tanta quanto sobre a norma anterior, não disse que a maioria dos associados da APEL aplica o AO;

- disse que a SPA não aceita o AO; mas não disse que a decisão da administração da SPA foi tomada à revelia dos seus associados, não disse que a decisão foi fundamentada em pressupostos falsos, não disse que o presidente da SPA declarou que escreve livros para crianças usando o AO, não disse que a maioria dos seus membros da SPA usa o AO;

- disse que “entretanto multiplicaram-se as reacções hostis além-Atlântico.”; mas não disse que no Brasil o AO está em plena e pacífica aplicação.
As reações de quem pontualmente no Brasil ainda desenterra o tema "AO" têm apenas dois impactos: o primeiro, nos caturras portugueses, o segundo, no ego do brasileiro que se lembrou de uma coisa que já não lembra a ninguém.


Numa coisa estamos de acordo com PM, o AO é um ato político. Mas deixamos de estar de acordo quando o PM acha que este ato político é pecaminoso, mas os atos políticos que estão na base da ortografia que ele quer continuar a usar, esses não são pecaminosos.
Na verdade, a Reforma Ortográfica de 1911, foi um ato político,  o Acordo Ortográfico luso-brasileiro de 1931 foi um ato político, o Acordo Ortográfico luso-brasileiro de 1945 (que o Brasil não aplicou, que foi elaborado na sequência do AO 1943 que Portugal não aplicou), foi um ato político, e a Reforma Ortográfica portuguesa de 1973 também foi um ato político.

Assim, fica por saber porque é que o AO1990 tem o pecado de ser um ato político, e a RO1911, o AO1931, o AO1945 e a RO1973 (que PM usa e acha perfeitos) não têm esse pecado, uma vez que, todos eles, foram também atos políticos.


PM levanta ainda a questão dos pareceres pareceres técnicos desfavoráveis ao AO. Sendo certo que foram vários, eles hoje dizem nada sobre a aplicação do AO, mas dizem muito sobre quem os emitiu. Se algum dos autores desse pareceres decidir comparar as catástrofes anunciadas com a realidade da aplicação do AO, terá apenas uma coisa a fazer: pedir desculpa.


Por fim o PM expõe-nos os seus problemas práticos com o AO:

-  ele está com um problema com o corte da raiz etimológica e da família das palavras, tudo coisas que, depreende-se, não existiam na ortografia anterior ao AO. No entanto, ele não tem problemas com as seguintes perdas etimológicas consagradas na tal (para o PM) cristalização ortográfica de 1945/73: estender (mas extensor), Estremadura (mas extremo), idade (mas etário), aquisição (mas adquirir), Chipre (mas cipriota), Guimarães (mas vimaranense), aposentado (mas pouso), erva (mas herbal), geral (mas genérico), e muitas, muitas outras. O que é que estas todas têm de tão perfeito e patrimonial que, por exemplo, o tal Egito/egípcio tem de tão imperfeito e estranho à ortografia do Português?;

- ele não sabe como há de distinguir o espetador do espetador. Desde logo ele pode escrever espectador, que estará a escrever bem. Seja como for, ele vai resolver este problema da mesma forma que resolve estes outros “problemas” consagrados na (para o PM) perfeição ortográfica de 1945/73: colher de colher, molho de molho, golo de golo, gema de gema, dita de dita, e dezenas de outras. O que é que estes “problemas” têm de tão perfeito e patrimonial que, por exemplo, o “problema” espetador/espetador tem de tão imperfeito e estranho à ortografia do Português?;

- ele ainda diz que as consoantes mudas não eram mudas. No entanto, as consoantes mudas foram sempre mudíssimas, e só ainda permaneciam na ortografia porque em 1911, entre outros disparates, alguém pretendeu que as consoantes mudas tinham voz;

-ele está com problemas em escrever os meses do ano com minúscula. Eça escreveu os meses e as estações do ano com minúscula, e outros escritores maiores da nossa Língua, também, e nenhum deles teve problemas com isso. Os falantes de francês e espanhol também se dão bem a escrever os meses e as estações do ano com minúscula. Os brasileiros também. E, em boa verdade, o único problema que nós temos é não fazer o mesmo há mais tempo:

-ele está com problemas com “arquitetas” que agora são lascivas e antes não eram; mas como tem ele lidado com as “patetas”, essas também eram/são lascivas? Ou será que o PM, para evitar problemas de lascívia com patetas, escrevia/escreve “pactectas”?

maio 24, 2013

Se a ignorância e a falta de estudo dessem equivalências…

"Considerando que o Acordo Ortográfico de 1990 não respeita a origem nem a evolução natural da Língua Portuguesa; (...)" (via Aventar)
Isto foi escrito e aprovado ontem numa assembleia de uma Associação de Estudantes universitários.

Estes estudantes não estudaram.

Se estes estudantes tivessem estudado, saberiam que o que não respeitou a origem e a evolução natural da língua portuguesa foi a carga de consoantes mudas e grafemas gregos que se começou inserir na ortografia a partir de meados do século 16.

Garcia de Resende ainda escreveu “proteitor”, aportuguesamento do latim “protector”, mais tarde adulterado por eruditismo ortográfico para “protector”. Camões ainda escreveu “aspeito”, aportuguesamento do latim “aspectu”, pouco depois adulterado por eruditismo ortográfico para “aspecto”. E porque escreveram Resende, Camões e tantos outros assim? Pelo mesmo motivo que nesse tempo (como hoje) se escrevia e pronunciava “respeito” aportuguesamento do latim “rescpectu”, ou “leitor” aportuguesamento do latim “lector”. Também nestes (e em outros) casos existiram tentativas de adulteração etimologizante e desfiguradora da ortografia e da fonética genuínas do Português, mas essas não vingaram.

É importante saber que entre as caraterísticas de formação e evolução da nossa Língua está a eliminação das sequências consonânticas herdadas do latim. As “protecções”, “redacções”, “tracções” têm ortografica e foneticamente o mesmo valor das “contractações”, “satisfacções”, “afflicções”, “addições”, e estas ninguém lembra nem sente falta. A RO1911 eliminou a generalidades dessas consoantes mudas, e só erro grosseiro algumas foram mantidas.

Se a ignorância e a falta de estudo dessem equivalências, estes estudantes tinham obtido a licenciatura ontem. Mais ou menos como estes.

Façam como o Pedro que foi estudar e já não se deixa enganar.


Também noticiado no "Publico".

maio 07, 2013

Ainda sobre a não aplicação do AO90 no sistema educativo de Angola; o testemunho de um professor angolano.

A propósito das declarações do ministro da Educação de Angola sobre a não introdução do AO no novo ano letivorecebemos o testemunho de um professor angolano cuja identidade, por motivos óbvios, protegemos:
Só o ministro da Educação [de Angola] sabe quais são as tais "implicações no sistema de ensino" que a aplicação do AO poderia ter trazido. Também só ele sabe quais são as 25 bases de um AO que tem 21 bases.
Quanto às dificuldades de transmitir a nova ortografia, será que o 'analfabeto', seja ele menor ou maior de idade, tem mais facilidade em aprender a escrever ''óptimo'' ou "actuar" do que "ótimo" ou "atuar"?
Não nos deem desculpas esfarrapadas sobre a não aplicação do AO. A recente reforma educativa poderia e deveria já ter incluído o emprego da ortografia simplificada em vez de ter mantido a ortografia velha. Isso teria facilitado o ensino da escrita e deixaria os alunos a aprender a ler e escrever na ortografia dos outros países lusófonos.
Em vez disso, a reforma educativa veio complicar uma situação que já era difícil:  um regime de mono docência sem professores preparados para esse modelo; salas com mais de 50 alunos; avaliação diária de alunos (tirando tempo para introduzir conteúdos novos); classes de transição automática sem que se perceba o objetivo.
A não introdução do AO foi apenas mais um problema a juntar aos outros que o Ministro Simão e o Ministério da Educação de Angola criaram com a reforma educativa.

maio 02, 2013

Sem mentiras não há oposição ao AO que resista, também em Angola


Segundo o Jornal de Angola, o ministro angolano da educação, Pinda Simão, justificou a não aplicação do AO no novo ano letivo apoiando-se nos seguintes argumentos:
Até o Brasil, que já estava a aplicar o acordo, disse, recuou e Portugal também questiona alguns aspectos do diploma. [...]. [H]á problemas em 20 das 25 bases do AO90″.
Fonte.

Três argumentos contra o AO, três mentiras factuais, zero surpresas.
No que respeita à aplicação do AO, nem o Brasil não recuou, nem Portugal não tem dúvidas.
Quando aos problemas nas 20 das 25 bases, lembramos, sem comentar, que o AO tem apenas 21 bases.

O triplo equívoco de Pinda Simão satisfaz quem vive de mentiras. Já se desceu ao ponto de a direita retrógrada portuguesa ter de se alimentar das migalhas que caem da mesa farta do MPLA


Pós texto: Ainda sobre a não aplicação do AO no sistema educativo de Angola: o testemunho de um professor angolano.

Obrigado !

Em abril o nosso  em Português Grande  teve um novo record de visitas, superando o record do mês anterior.

A generalidade das visitas chegam-nos através dos motores de busca mas ficamos felizes por ver aumentar a proporção de acessos diretos, aqueles que nos chegam de links colocados no facebook, na blogoesfera e em sítios eletrónicos dedicados à nossa Língua.

No caso dos motores de busca, a maioria dos acessos recai sobre as nossas páginas estáticas.

A página mais visitada do blog continua a ser "A Falácia das Consoantes Mudas Diacríticas".

Um dia pode ser que se faça a historia da vida breve deste blog, dos efeitos que teve, que provocou. Mas isso acontecerá apenas quando for o momento de dar a missão por cumprida, algo que está bem mais próximo hoje do que quando começámos.

Uma palavra especial de amizade aos nossos irmãos brasileiros que, quase sempre através de nós, percebem que o AO não é um problema em Portugal, e que os portugueses não são os tacanhos xenófogos que o desacordismo apregoa.

A todos os visitantes, ocasionais ou regulares, obrigado.